A Casa de Fervença, antigamente uma vasta propriedade agrícola mas hoje reduzida a cerca de meio milhão de metros quadrados de terrenos de lavradio e mato, estende-se do sopé do Monte da Franqueira até às ruínas do histórico Castelo de Faria e possui, como parte urbana, a Casa Senhorial, a Capela e várias construções habitacionais e agrícolas.
Como aconteceu a grande parte das Casas Senhoriais de Portugal, também a Casa de Fervença, perdeu o seu poderio económico com a extinção dos Morgadios, a transformação dos aforamentos e a queda da Monarquia, o que ocasionou deficiente conservação urbana e, consequentemente, uma degradação do edificado que somente terminou em meados de 1971, altura em que o atual proprietário adquiriu aos seus irmãos a parte que lhes tocara por herança e iniciou as obras de beneficiação.
Esta antiga e nobre Casa, que integra construções de difícil datação, apresenta-se com traça dos finais do Sec. XVI e foi o berço de fidalgos de cota d’armas que, muitas vezes com o sacrifício da própria vida, nos cinco cantos do mundo honraram a sua Pátria.
Está ereta no sopé Nascente do Monte da Franqueira (www.franqueira.pt), a cerca de quinhentos metros do antiquíssimo e histórico Castelo de Faria e a ela se referem os escritos antigos, como sendo a primeira e principal residência da linhagem dos Gayos, sabendo-se que D. Soeiro Mendes da Maia, o Bom, contemporâneo do Conde D. Henrique e de seu filho D. Afonso Henriques, 1º Rei de Portugal, foi pai de Gonçalo Soares Mouro, que se recebeu (casou) com D. Urraca Soares Gayo, irmã de Nuno Soares Gayo, desta Casa.
A sua fachada principal comporta uma varanda corrida, uma escadaria e uma Capela. A varanda, com colunas de granito de grão fino sobre pilares de granito de grão grosseiro e assentes em quatro arcos apainelados do mesmo material, tem, no seu extremo poente, uma escada que dá acesso ao amplo terreiro que a defronta e, no extremo nascente uma Capela que, sob o Orago de Nossa Senhora da Ajuda, foi instituída em 1617 e, mais tarde, em 1765 e 2017, foi visitada pela Autoridade Diocesana.
Nesta Capela, segundo a pedra tumular que se pode ver em frente ao altar, repousam os restos mortais de Dona Maria Felgueiras Gayo, falecida em 1588.
O terreiro, que a Nascente é delimitado por uma casa construída em granito grosseiro, antiga residência de criadagem e hoje adaptada a Unidade de Alojamento Turístico e a Poente, por um muro que o separa da eira e seus cobertos, hoje uma ampla Sala, cozinha e Sanitários de apoio, possui, na parte Sul, um alto muro ameado no qual se abre um portão em cujo frontão, encimado por cruz, sobressai uma delida pedra de armas. Esta pedra de armas, um escudo partido em pala, que na primeira tem as armas dos Gayos e na segunda a dos FELGUEIRAS e é encimado por um Elmo aberto, com virol e timbre dos Gayos (castelo sobrepujado por uma bandeira de arminhos).
Por curiosidade se refere, que as armas dos GAYOS são: sobre um fundo de prata, três pintas de arminho de negro postas em pala e dispostas em faixa, chefe partido de vermelho e ouro, com um castelo de oiro no vermelho e quatro palas de vermelho no oiro e, as dos FELGUEIRAS: sobre um fundo de azul, nove lisonjas apontadas de prata e moventes do chefe, da ponta e dos flancos do escudo.
Para complementar esta descrição, acrescenta-se que existe ainda um magnífico terreiro interior rodeado por varandas e dois terreiros ajardinados rodeados por altos muros.
A Casa de Fervença foi morgadio, instituído em 1561, com capela na Igreja Matriz de Vila do Conde e os seus Senhores, conforme documentos autênticos, não só são descendentes dos GAYOS, dos FELGUEIRAS, dos ARAÚJOS, dos MAIAS, dos MACHADOS, dos PAES, dos FARIAS do Castelo de Faria, dos VASCONCELOS, dos MELLOS, dos SILVAS, dos MENEZES, dos LIRA, dos MOSCOSOS, dos PONCE DE LEON, dos CURUTELOS, dos RIBEIROS, dos LAGO, etc., mas também, de D. RAMIRO III, Rei de Leão.
Entre outros, foram Senhores desta Casa:
MARTIM GOMES GAYO, serviu a D. Afonso III, a D. Diniz e a D. Afonso IV, acompanhando este na Batalha do Salado (1340) e nela morrendo.
LOURENÇO MARTINS GAYO, apelidado de LEIRIA, serviu El-Rei D. Pedro I (1357-1367) e tanta confiança lhe mereceu que este lhe entregou a criação de seu filho bastardo D. João, Mestre de Aviz, depois El-Rei D. João I (1357-1433), a quem também serviu e acompanhou aquando da morte do Conde de Andeiro, na batalha de Aljubarrota e em outras ocasiões (1383-1385). Foi Tesoureiro da Casa Real e Alcaide-Mor da cidade de Leiria.
ESTEVÃO LOURENÇO GAYO, foi armado cavaleiro por El-Rei D. João I antes de entrar na batalha de Aljubarrota (1385)e era casado com D. Thereza de Faria, filha do heróico Alcaide do Castelo de Faria, Nuno Gonçalves e de sua 1ª mulher D. Thereza de Meira, filha de Gonçalo Paes de Meira, Senhor de Ponte de Lima, Colares e outras terras.
JOÃO GOMES GAYO, num duelo matou o senhor da Casa de Cavaleiros, por ambos pretenderem a Quinta e Couto de Bouçó, em Vila do Conde, pelo que El-Rei D. João II (1481-1495) lhe mandou confiscar todos os bens.
Nestes apuros decidiu armar um navio, fazendo-se pirata, e tantas proezas obrou contra os inimigos de Portugal e do Papa que El-Rei D. Manuel (1475-1521) lhe perdoou, mandando restituir-lhe todos os bens e fazendo-lhe muitas mercês. Também o Papa lhe concedeu Graças e um Breve para que, na sua Capela da Madre de Deus, da Póvoa de Varzim, pudesse ter o Santíssimo Sacramento.
JOÃO MARTINS GAYO, foi também senhor do Couto de Bouçó e assistiu em Vila do Conde. Foi armado cavaleiro pelo famoso Capitão Luiz Loureiro, em 1543 na praça de Çafim, quando o Xarife, Rei de Marrocos veio sobre ela. Foi casado com D. Maria Affonso da Maia.
ANTÓNIO MARTINS GAYO, foi também senhor do Couto de Bouçó e da Honra de Palmeira de Faro. Armado cavaleiro, como seu pai, pelo Capitão Luiz Loureiro, viu tal honraria ser mais tarde confirmada por El-Rei D. João III. Foi Capitão-Mor de Vila do Conde e instituiu em 25-1-1561 o Morgado dos Gayos Felgueiras da Casa de Fervença, com capela em honra de S. Miguel-o-Anjo, na Igreja Matriz de Vila do Conde, onde foi sepultado. Foi casado com D. Maria Felgueiras de Valladares.
MANUEL GAYO CARNEIRO, foi também senhor da Quinta da Barca do Lago com a qual instituiu em Abril de 1664 um Morgadio com Capela da invocação de Nossa Senhora Peregrina, dotando-o com as estalagens que havia junto à passagem da Barca. Era irmão de Gaspar Carneiro Gayo, Balio da Ordem do Hospital e um dos seus mais importantes Membros em Malta onde possuía o Solar dos Carneiros e de Pedro Carneiro Gayo, também Cavaleiro Maltés e Comendador de Cernelhe, foi cativo na batalha de Alcácer-Quibir (1578) e mais tarde Fidalgo da Casa Real, por mercê de El-Rei D. João IV em recompensa pelo ato heroico de seu referido irmão, PEDRO CARNEIRO GAYO que, no ano de 1648, indo como Capitão-de-mar-e-guerra num dos galeões da armada real que fez a restauração do Brasil, pelejou tão valorosamente contra 8 fragatas Holandesas que meteu a fundo duas e desmastriou uma. Vendo-se, porém, com a maior parte da tripulação morta ou ferida na sua nau do Rosário, incluindo o seu sobrinho BARTHOLOMEU FELGUEIRAS GAYO, proprietário da Casa de Fervença, e temendo ser feito prisioneiro, teve a coragem de antes querer morrer ali do que passar por tal baixeza. Assim pensando, deixando que as naus inimigas preparassem a abordagem, assentou-se sobre um barril de pólvora e, ele mesmo pegando-lhe fogo, fez explodir a nau: morreram todos e consigo afundou mais duas naus inimigas. Antes morrer do que ser prisioneiro, assim clamou Pedro Carneiro Gayo e toda a sua gente que, em tais apertos, o seguiu, porque morrer pela Pátria é doce e decoroso. Assim morreu PEDRO CARNEIRO GAYO porque era descendente do Alcaide do Castelo de Faria NUNO GONÇALVES DE FARIA, exemplo sublime da lealdade portuguesa. Em memória deste acto heróico de PEDRO CARNEIRO GAYO, D. João IV mandou fazer um retrato que tinha no Paço Real, segundo consta de um autêntico alvará passado em Lisboa em 8 de Julho de 1549 e registado na Chancelaria no Livro dos Privilégios e Mercês, página 220 verso.
JOÃO FELGUEIRAS GAYO, foi Comendador de S. Facundo na Ordem de Cristo, foi Mestre de Campo de Infantaria da Província do Minho e Governador das Armas do Porto e da Província do Minho, nas ausências do Marquez de Minas, por Carta Régia. Serviu os Reis D. João IV, D. Afonso VI e D. Pedro II (1640-1706). Casou com a sua parente D. Brites da Silva Pimenta, filha herdeira de Belchior Pimenta da Silva, juiz da Alfândega de Viana e de sua mulher D. Maria Fagundes do Rego Barbosa.
JOÃO MANUEL JÁCOME DO LAGO FELGUEIRAS GAYO PONCE DE LÉON, nascido a 12-12-1788, foi também Senhor do Castelo de Curutelo e da Casa da Barca do Lago e de todos os demais bens de seus pais. Foi Comendador da Ordem Militar de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa e Cavaleiro da Ordem de Cristo.
D. ROSA MARIA DO LAGO FELGUEIRAS GAYO, filha do antecessor, nasceu no Castelo de Curutelo a 7-4-1842 e foi também Senhora da Casa da Barca do Lago. Casou, em 1854, com o seu parente José Machado Paes de Araújo Felgueiras Gayo, nascido a 28-12-1819 e falecido em Abril de 1883, filho de Belchior Machado Paes de Araújo Felgueiras Gayo e de D. Ana Joaquina de Queirós Machado.
CARLOS ALBERTO MACHADO PAES DE ARAÚJO FELGUEIRAS GAYO, filho a antecessora, nasceu a 21-12-1865. Foi por Decreto de El-Rei D. Carlos I, em 10-6-1905, nomeado Visconde de Fervença. Casou em 1900 com D. Cândida Gomes Vinha, nascida a 22-4-1885 e falecida em Agosto de 1914, filha de António Gomes Vinha e de D. Maria Júlia dos Santos Silva. Casou em segundas núpcias com a sua cunhada, irmã da primeira mulher, D. Elisa Gomes Vinha, em 4-11-1917.
CARLOS EDUARDO MACHADO PAES DE ARAÚJO FELGUEIRAS GAYO, filho do antecessor e da sua primeira mulher, nasceu na Casa de Fervença a 2-1-1902. Dedicou toda a sua vida à investigação agronómica, vindo por isso a ser agraciado, a título póstumo, em 10 de Junho de 1953 com a Comenda de Mérito Agrícola. Casou em 8-12-1940 com D. Maria Gonçalves da Silva Reis, filha de Manuel Gonçalves da Silva e de D. Ana da Costa Reis e faleceu na sua Casa de Fervença, em 25-5-1953.
EDUARDO ALBERTO DA SILVA FELGUEIRAS GAYO, filho do antecessor e de sua mulher D. Maria Gonçalves da Silva Reis, nascido na Casa de Fervença em 01.07.1946 e casado, em 24.05.1969, com D. Marlene Doroti Oliveira e Silva Felgueiras Gayo, nascida em Angola, são os atuais Senhores da Casa que a beneficiaram com vultosas obras de restauro e conservação.